Estamos todos conscientes da era em que vivemos actualmente no que diz respeito à violência entre etnias, religiões, países, empresas e afins. Por acréscimo, quando paramos e pensamos sobre cada uma delas (i.e. guerras, situações de violência), normalmente tendemos a colocarmo-nos no lugar das vitimas visíveis e/ou directas consoante o local. Por exemplo, quando falamos de ataques relacionados com “simpatizantes ou apoiantes” violentos de uma certa religião pensamos nas vítimas directas deles. Ou seja, pensamos em quem possa não estar a favor dessa mesma religião. O mesmo acontece com etnias, clubes de futebol, nacionalidades, etc.etc. No caso efectivo das guerras, pensa-se muito nas pessoas que estão no local onde as mesmas estão a decorrer (i.e. nos residentes).
Salvo algumas excepções como familiares, colegas, direcções, quem se lembra dos soldados, tropas e/ou agentes da polícia que intervêm directamente e na “linha da frente”? Sejamos reais e sinceros, a maior parte das pessoas não pensa na polícia como vítima, e muito menos nos familiares deles.
(fotografia retirada da internet)
A Desordem de Stress Pós-Traumático é uma condição séria, incapacitante que afecta agentes da policia de segurança, tropas, e outras profissões que lidam com situações gritantes e traumatizantes (como a designação indica). Ela é um trauma e estado stressante relacionado com a exposição a um evento, teste ou provação que envolva morte, lesão física severa ou ameaça às mesmas. As profissões que mais podem sofrer desta desordem são profissões que incluem, entre muitas, sobreviventes de tiroteios, ataques bombistas, violações, agressões, mutilações ou outras mais traumatizantes. Ou seja profissões como tropas, bombeiros, policias, médicos, bombeiros. Os familiares de profissionais que desenvolvem esta desordem podem também, por empatia, proximidade ou por testemunharem casos traumatizantes, ter a saúde física e mental em risco.
Estar apto a ser um profissional da policia, agrupamento de bombeiros, medicina, enfermagem e/ou outros, é passar por uma complexidade de exames, testes, estudos necessários para responder a situações traumatizantes. Muito mais preparado do que a maior parte das pessoas pensa. Lidar com situações de guerra, tentativa de suicídio, violência entre gangs, corpos mutilados, entre outras situações, requer uma preparação exímia, profunda e à altura. Nem todos os profissionais estão aptos a isso, e é legitimo.
Pessoas com esta desordem não conseguem pensar com clareza, são hipervigilantes, têm pouca paciência, irritam-se facilmente, podem não estar a dormir bem por conta dos pesadelos, despistados, têm prestações fracas, relembram-se constantemente dos eventos traumáticos, estão auto-medicados ou, por questões de receio, evitando situações traumáticas, e demonstrando que a sua prestação tem baixado de nível a olhos vistos.
Como referido, são muitas as situações que podem causar esta desordem. Ainda assim, alguns profissionais podem não ter esta desordem.
Porquê?
Por causa de vários factores internos e externos. Internamente, podemos contar com factores como a maneira como lida com a situação, capacidade de resolução de problemas, quantidade de traumas, outros factores estressores que possam estar a concorrer que o potencial episódio desencadeador, como por exemplo a depressão ou o abuso de substancias. Já externamente, os factores podem ser, entre outros, traição, rejeição pela comunidade e a falta de apoio.
Existem vários tratamentos possíveis para esta desordem. Estes podem ser, entre outros, o apoio psicológico, apoio psiquiátrico, apoio familiar, apoio da comunidade, apoio dos colegas, EMDR, terapia cognitivo comportamental.
Como muitos, os policiais podem ser relutantes na busca de auxílio, mas cabe também à gestão, direcção, pares, amigos, familiares e outras pessoas atentas saberem sinalizar estas situações, bem como prevenir. Ignorar esta condição pode significar por parte do profissional o receio em perder um trabalho, e sentir-se fraco mas, ao contrário do que se pensa, é um sinal de força, humanidade e respeito pelo trabalho, colegas, direcção e gestão dos policiais.
No meio desta mesma desordem encontram-se também familiares que querem ajudar e servir de auxilio pelos seus entes queridos mas, muitas vezes, sentem se tão impotentes perante a situação que, por vários motivos, podem acabar por achar, dadas as alterações comportamentais, estarem perante uma pessoa estranha.
Estes mesmos familiares podem vir a desenvolver os mesmos sintomas dos policiais com desordem de estresse pós-traumático por conviverem com eles e experienciarem, após relatos, empatia e trauma perante a situação relatada.
Assim, e como apreço os polícias que leem esta nota, termino escrevendo: “Obrigada por tudo, e tomem bem conta de vocês, de forma a que TAMBÉM consigam tomar conta de nós desempenhando bem a vossa profissão. Aos que leem mas não são policiais: sorriam e agradeçam aos policiais, bombeiros, médicos, enfermeiros, e outros profissionais, que experienciam situações de risco ou traumatizantes por ELES E POR NÓS.
Abraço,
Dália Matsinhe
Mestre em Psicologia Social e das Organizações Pós-graduada em Ciências Forenses Licenciada em Psicologia Criminal e do Comportamento Desviante; Sócia Gerente de LexPsique - Formação e Consultoria, Lda. (Maputo)
Membro da Direcção Executiva da Associação Moçambicana de Prevenção ao Crime e Violência (AMOPCRIV) Membro da Ordem dos Psicólogos Portugueses desde a sua fundação até ao Ano de 2019 Membro da American Psychological Association
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